Quem nasceu primeiro: o ovo ou a galinha?

A crônica de Francisco Santana

Ao discutirmos assuntos irrelevantes, perdemos tempo. Na maioria das vezes, o final é conhecido, mas as interpelações causam desavenças. O tempo é precioso para ser gasto com ideologias subjetivas. Ninguém é dono da verdade absoluta. É essa a verdade que procuramos desde o nosso nascimento. Hoje, se discute notícias falsas tomando-as como se fossem verdadeiras. Argumentos são usados sem comprovações. É como discutir sobre quem nasceu primeiro: o ovo ou a galinha?

Irrita ouvir discussões acirradas na explicação política de direita, esquerda ou de centro. Seria de bom grado o político decente defender ideias para melhorar a nossa economia e no progresso do nosso país. As discussões seriam inteligentes e com qualquer resultado, ganharia o povo. O tempo perdido seria bem mais aproveitado para harmonia do lar, crescimento interior e prática do bem. Muitos brigam sem saber o porquê da discussão. Outros se apegam às suas ideias arcaicas, mas o orgulho os cega não os deixando raciocinar por serem extremistas e radicais.  

Semana passada um assunto foi pauta de todos os meios de comunicações fazendo com que a população também participasse opinando, brigando e defendendo sua tese – Ditadura Militar. Ela teve seu início com o golpe militar de 31 de março de 1964, resultando no afastamento do Presidente da República, João Goulart, e tomando o poder o Marechal Castelo Branco. Esse golpe de estado instituiu no país uma ditadura militar que durou até a eleição de Tancredo Neves em 1985. Os militares alegaram que havia uma ameaça comunista no país. Questionou-se: foi um golpe de 31 de março provocado por militares ou o que houve foi uma revolução contra a entrada do comunismo no Brasil?  

Cada um interpreta a seu modo por viver na época ou por ouvir dizer. Vivi meio a ela como militar sem entender muito bem o que estava acontecendo, mas tomei conhecimento de muitas prisões, extradições e mortes dos considerados comunistas, subversivos ou inimigos do povo brasileiro.  Para toda ação, existe uma reação. Diante de tantos comentários, julgamentos, movimentos sociais e intervenção militar, surgiram músicas com letras ricas em conteúdo, compositores talentosos que compunham as chamadas “músicas de protesto”. Centenas delas foram censuradas e proibidas de serem programadas. A proibição aguçou a curiosidade popular e daqueles que tinham interesse em ouvi-las e entendê-las. Nessa época, eu era DJ da Associação dos Sargentos e Suboficiais de Juiz de Fora. Toda semana uma relação de músicas me era entregue para não tocar. Programei a música “Era um garoto que como eu amava os Beatles e Rolling Stones” e quase fui preso.

Vamos nos lembrar de algumas:

*** “Pra não dizer que não falei das flores” – Geraldo Vandré. Considerada hino da resistência contra a ditadura militar.

*** “Apesar de você” – Chico Buarque de Holanda. Comentava-se que a letra fazia referência ao governo do Gal. Médici. Para driblar a censura, Chico dizia que a música contava uma história de uma briga de casal.

*** “O Bêbedo e a equilibrista” – Aldir Blanc e João Bosco, gravada por Elis Regina. Essa música foi considerada “hino da anistia”.

*** “Alegria, alegria” – Caetano Veloso. Música contra a cultura importada: Brigitte, Cardinales e Coca-Cola.

*** “Cálice” – Chico Buarque e Milton Nascimento. Nota-se o duplo sentido da palavra “Cálice” e “Cale-se”, contra a censura.

*** “É proibido proibir” – Caetano Veloso. Manifestação de mudanças culturais que estavam ocorrendo no Brasil.

*** “Acender as velas” – Zé Kéti. Crítica sobre as péssimas condições de vida nos morros do Rio de Janeiro.

*** “Que as crianças cantem livres” – Taiguara. Ele foi o mais censurado pela ditadura, 68 canções.

*** “Jorge Maravilha” – Chico Buarque. Você se lembra desse refrão? “Você não gosta de mim, mas sua filha gosta”.   O Gal. Geisel odiava Chico Buarque, mas sua filha admirava o trabalho do Chico.

Anos de chumbo. Músicas eternizadas. E a qualidade de nossas músicas hoje? Trancado no meu quarto me sintonizo em três amigos que me enchem de prazer em ouvi-los. Grandes intérpretes, talentosos e de bom gosto musical. Seus nomes vão enriquecer esse meu trabalho: Rodrigo Chaffer, intérprete de Barbacena; Miúcha Trajano, intérprete de Ubá e Karina Cleto, intérprete de Araxá. Eles fazem da música suas bandeiras. Meus ouvidos se acostumaram a ouvir e gostar do trabalho de vocês.  

Tudo isso porque: “A música me sustenta… a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional”. (Janaína Sérvulo).

 

(Fonte: Blog do Unasp).

Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao utilizar nossos serviços, você concorda com tal monitoramento. Aceitar Saiba Mais