Pauta em prosa, verso em trova (volume 46)

Por JGHeleno*

 

CLAUSTRO ABANDONADO

 

Esta ruína que vês, cujo zimbório abriga,

Na severa feição de venerável urna,

Recalcadas paixões de tradição soturna,

É um claustro, que existiu ao sol da idade antiga.

 

– Entra-lhe a porta e vê: cresce por tudo a urtiga…

Melancoliza o ambiente uma expressão noturna;

Negreja, a cada passo, a boca de uma furna,

Bocejando, ao torpor de secular fadiga.

 

– Ajoelha, pecador. São túmulos daquelas

Que a glória teologal de penitências tantas

Por fim transfigurou na solidão das celas!

 

– Ajoelha, pecador. Nestas ferais gargantas,

Sufocaram-se os ais das místicas donzelas

– Monjas, durante a vida; ao fim da vida santas.

(Luís Carlos, Colunas, 1920.)

 

Trago outro soneto de Luís Carlos da Fonseca Monteiro de Barros – (1880-1932), referido normalmente apenas como poeta Luís Carlos.

Pertenceu à Academia Brasileira de Letras (cadeira 18). Foi da última geração dos poetas parnasianos brasileiros. Ele não foi um parnasiano típico como Olavo Bilac, Alberto de Oliveira e Raimundo Correia, por exemplo. Já escrevemos aqui que o que caracteriza um artista é a liberdade, por isso seria uma contradição o poeta ter que seguir à risca os cânones de qualquer movimento ou escola literária. O que marca cada movimento, como o realismo, o romantismo, o naturalismo, são alguns traços comuns a um grupo de escritores, que permitem enquadrá-los didaticamente dentro de algum desses “ismos”. Mas ninguém se faz esse tipo de  pergunta quando vai ler um poema. O que  o leitor quer saber é se a poesia a ser lida toca seu universo interior, se os dois universos dialogam entre si.

Apesar de ser um grande poeta, Luiz Carlos publicou seu primeiro livro só aos 40 anos de idade, em 1920, em plena efervescência que explodiria na famosa Semana de Arte Moderna de 1922, da qual ele não fez parte. Livros publicados: Colunas (poesia, 1920); Encruzilhada (prosa, 1922); Astros e abismos (poesia, 1924); Rosal de ritmos (resumo histórico sobre a evolução da poesia brasileira, 1924); Amplidão (poesia, 1933, póstumo); Poesias escolhidas (poesias, 1970, póstumo).

É patrono da cadeira 26 da Academia Barbacenense de Letras e pai da grande escritora Lasinha Luiz Carlos, fundadora da referida cadeira.

O homem vive à procura de sentido para a vida. Não é um sentido pronto, mas em construção. A religiosidade que, para a maioria das pessoas, se manifesta na escolha de uma religião, é um dos quatro pilares que pautam essa busca de sentido. E o soneto que transcrevemos acima faz referências à questão religiosa.  Mas é uma religiosidade um tanto pessimista. É interessante repetir a leitura, porque é um poema erudito na sua linguagem, aspecto comum a muitos parnasianos. Eu gosto de ler um poema inúmeras vezes, porque a cada leitura, sentidos, que saltam aos olhos ao primeiro olhar, se vão aclarando, e outros sentidos vão se agregando.

Nada substitui uma visita. Foi com essa ideia que visitei recentemente (26/05/2023) o sopé do monte Parnaso na Grécia. O nome da escola literária – parnasianismo – remete a essa montanha, que fica em Delfos, onde havia um famoso oráculo de Apolo (hoje apenas um sítio arqueológico). Dessas ruínas, pode-se ver o céu quase tocando o alto do monte Parnaso, onde os consulentes que visitavam o oráculo imaginavam as musas cantando e dançando.

 

Como tudo termina em trova:

 

Numa escola literária

imitar muito é um mal

pois si cria obra ordinária

sem o lustre original;

 

 

  • Da Academia Barbacenense de Letras e da Delegacia da UBT em Barbacena.

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