Diagnóstico precoce do Autismo

Por Waleska Magierek

Estima-se 70 milhões de pessoas tenham autismo, cerca de 1% da população mundial (ONU). Nos últimos dez anos, os dados sobre prevalência têm mudado bastante, com aumento importante nos números, que variam de acordo com a metodologia e local do estudo. Estatísticas americanas, apresentadas pelo Centers for DiseaseControlandPrevention (CDC), passaram de 1:150, em 2000, para 1:68, em 2010, afetando mais pessoas do sexo masculino, na proporção de 3 a 5 homens para 1 mulher (2013). Há uma grande discussão acerca de que se esse aumento é real ou se há uma maior capacidade dos profissionais em identificar os casos, conjuntamente com a ampliação dos critérios diagnósticos utilizados e maior consciência da população. Mas não há dúvida de que existe uma demanda maior por serviços de qualidade capazes de formular diagnóstico e prover o suporte necessário para pacientes e familiares, ao longo da vida.

1.Como é feito o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista – TEA?

O diagnóstico dos Transtornos do Espectro Autista (TEA) é clínico e deve ser feito de acordo com os critérios do CID 10 (OMS, 1993) e DSM-5 (APA, 2014), pela anamnese com pais e cuidadores e mediante observação clínica dos comportamentos (há escalas e testes específicos para esta avaliação), pela equipe multiprofissional (médico, psicólogo/neuropsicólogo, fonoaudiólogo, etc.). Geralmente o diagnóstico não leva muito tempo para ser concluído: o processo de avaliação deve ser estruturado de maneira que a criança seja avaliada por todos os profissionais da equipe, a fim de que o diagnóstico tenha fidedignidade e possa orientar o tratamento/reabilitação.

2.Quais são os critérios diagnósticos do autismo?

Os critérios diagnósticos do Transtorno de Espectro do Autismo, segundo o DSM 5 (APA, 2014) são:

  1. Déficits persistentes nacomunicação social e nas interações, clinicamente significativos manifestados por: déficits persistentes na comunicação não-verbal e verbal utilizada para a interação social; falta de reciprocidade social; incapacidade de desenvolver e manter relacionamentos com seus pares apropriados ao nível de desenvolvimento.
  2. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos dois dos seguintes: estereotipias ou comportamentos verbais estereotipados ou comportamento sensorial incomum, aderência excessiva à rotinas e padrões de comportamento ritualizados, interesses restritos.
  3. Os sintomas devem estar presentes na primeira infância (mas podem não se manifestar plenamente, até que as demandas sociais ultrapassem as capacidades limitadas).
  4. Os sintomas causam limitação e prejuízo no funcionamento diário.

 

O DSM-5 também sugere o registro de especificadores: Com ou sem Deficiência intelectual, com ou sem comprometimento da linguagem concomitante, associado a alguma condição médica ou genética conhecida, ou a fator ambiental, associado a outro transtorno do desenvolvimento, mental ou comportamental, com catatonia.

3. Quais sinais podem alertar pais e professores quanto à possibilidade de TEA?

As alterações e/ou diferenças no desenvolvimento infantil sempre devem nos alertar. Não necessariamente que tudo seja doença e/ou transtorno, mas devemos prestar bastante atenção aos comportamentos atípicos e desenvolvimento diferente do esperado para a faixa etária.

Sabemos que no TEA, as crianças possuem dificuldades no contato ocular, costumam andar na pontinha dos pés, costumam apresentar atrasos e/ou ausência da fala, apresentam facilidade na aprendizagem de um conteúdo específico (mas costumam aprender com dificuldades habilidades simples, apropriadas para sua faixa etária). A inteligência precisa ser avaliada de maneira global e não apenas sob apenas um aspecto.

A criança que apresentar algum sinal diferente daquele esperado para sua faixa etária deve ser encaminhada e avaliada por equipe competente e treinada, a fim deu que, caso haja alguma questão que necessite de investigação, o processo aconteça o mais rapidamente possível, trazendo benefícios para a própria criança.

4. Com quantos anos se identifica uma criança com autismo?

Os sintomas costumam estar presentes antes dos 3 anos de idade, sendo possível fazer o diagnóstico por volta dos 18 meses de idade.

Estudos demonstram que a identificação precoce dos sinais e dos sintomas de risco para o desenvolvimento do TEA é fundamental, pois, quanto antes o tratamento for iniciado, melhores são os resultados em termos de desenvolvimento cognitivo, linguagem e habilidades sociais (Dawson et al, 2010; Howlin et al., 2009; Reichow, 2012). Embora seja comum aos pais perceber alterações no desenvolvimento de seus filhos, antes dos 24 meses, muitas vezes demoram em procurar por ajuda especializada, por isso, os profissionais da atenção básica tem um papel fundamental na identificação inicial dos sinais e sintomas de risco para o TEA (Matson, Rieske&Tureck, 2011).

5.Por que a criança com TEA tem dificuldade em olhar no olho das pessoas?

Olhar nos olhos é uma importante estratégia de comunicação. Manter contato visual facilita a compreensão do que o outro fala, passa a impressão de que se está atento, seguro e é uma arma de convencimento bastante eficaz.

No caso de crianças autistas esta máxima parece não ser válida:elas dão muita importância ao que se fala. Com a mudança de foco ocular, elas perdem a chance de entender os significados das expressões faciais e não captam informações subjetivas relevantes transmitidas pelo olhar.

A forma como crianças com TEA (Transtorno do Espectro Autista) se comunica é bastante diferente das outras. A explicação à esta pergunta parece estar relacionada à forma como o cérebro das crianças com TEA se organizou: eles percebem o mundo de maneira diferente das outras pessoas.

Uma das primeiras estratégias de tratamento/reabilitação para o TEA é a melhoria da comunicação através do contato ocular. A Terapia Comportamental possui técnicas que favorecem o contato ocular com repercussão positiva no desenvolvimento global da criança.

6. Qual profissional pode auxiliar a lidar com os comportamentos inadequados?

Os comportamentos inadaptados no TEA (Transtorno do Espectro Autista) podem ser modelados de maneira a diminuir ou, até mesmo, extinguir sua ocorrência.

A Terapia Comportamental trabalha modelando os comportamentos de tal forma a melhorar a inserção social da criança ao seu meio, bem como auxilia os familiares a lidar com essas questões.

Crianças e familiares de pessoas com TEA se beneficiam muito com o acompanhamento em Psicologia Comportamental. Este é o profissional qualificado que ajudará a família a entender quais são os comportamentos típicos do TEA, poderáorientar à família sobre como lidar (o que precisa ser reforçado, o que precisa ser extinguido, como lidar com as birras, etc).

7. O TEA tem cura?

O TEA é um transtorno do Neurodesenvolvimento. Isto significa que a criança já se desenvolve, no útero materno, com um cérebro estruturado e organizado de maneira diferente, o que acarretará as diferenças e dificuldades que observamos ao longo de seu desenvolvimento.

O TEA é uma condição permanente, a criança nasce com TEA e torna-se um adulto com TEA.

Os pesquisadores e os especialistas de todas as áreas têm trabalhado muito a fim de encontrar explicações e soluções plausíveis para o TEA.

Contudo, todos os tratamentos até agora minimizam as dificuldades, não as curam.Os tratamentos favorecem o desenvolvimento, dentro das possibilidades de cada criança.

Por isso, precisamos ficar atentos às falsas promessas de cura! Não há medicação nem outra conduta que cure o TEA!

ValeskaMagierek é Psicóloga Clínica, com especialização em Neuropsicologia e mestrado em Psicobiologia. Atua no atendimento infantilde crianças com autismo, com déficits no desenvolvimento e com outras síndromes. É professora Tutora da FGV-RJ e diretora clínica do Centro AMA de Desenvolvimento.

REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA). Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM 5. Tradução de Maria Inês Correa Nascimento et al; revisão técnica Aristides VolpatoCordiolo. 5. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2014.

Canitano, R., &Scandurra, V. (2011). Psychopharmacology in autism: anupdate. Progress in Neuro- psychopharmacology&BiologicalPsychiatry, 35 (1): 18-28.

Centers for DiseaseControlandPrevention. (2012). Autism Spectrum Disorders (ASDs): Data &Statistics. Acessado em 26 de fevereiro, 2013. Disponível em http://www.cdc.gov/NCBDDD/autism/data.html.

Cotugno, A. J. (2009). Social competenceand social skills training andintervention for childrenwithAutism Spectrum Disorders. JournalofAutismandDevelopmentalDisorders, 39(9): 1268-1277.

Fuentes, J., Bakare, M., Munir, K., Aguayo, P., Gaddour, N., Öner, Ö. & Mercadante, M. (2012). Autismspectrumdisorders. In: Rey, J.M. (Ed.). IACAPAP e-TextbookofChildandAdolescent Mental Health. Geneva: InternationalAssociation for ChildandAdolescentPsychiatryandAlliedProfessions.

Howlin, P., Magia, I., Charman, T., &MacLean, W. E. (2009). Systematicreviewofearlyintensivebehavioralinterventions for childrenwithautism. American JournalonIntellectualandDevelopmentalDisabilies, 114 (1): 23-41.

Missouri Departmentof Mental Health – DivisionofDevelopmentalDisabilies. (2012). Missouri AutismGuidelinesInitiative. Autism Spectrum Disorders: GuidetoEvidence-basedInterventions. Acessado em 28 fevereiro, 2011. Disponível em http://www.autismguidelines.dmh. mo.gov/documents/Interventions.pdf

NationalCollaborating Centre for Women’sandChildren’s Health. (2011). Autism: recognition, referralanddiagnosisofchildrenandyoungpeopleontheautismspectrum. Nice ClinicalGuideline. 296 pp. Acessado em 28 fevereiro, 2011. Disponível em http://www.nice.org.uk/nicemedia/ live/135 72/56424/5 6424.pdf.

Organização Mundial da Saúde [OMS]. (1993). Classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. Porto Alegre: Artes Médicas.

Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao utilizar nossos serviços, você concorda com tal monitoramento. Aceitar Saiba Mais