Páscoa na visão de um desmancha prazer

Francisco de Santana

Eu me lembro, eu me lembro, era pequeno, bem pequeno e brincava na calçada da Rua Mariano Procópio, Bairro Alto das Fábricas, em Barbacena com meus amiguinhos. Nessa época, estávamos prestes a comemorar a Páscoa, que não tinha o glamour de hoje. Lá tudo era inocência e hoje tudo é comércio, marketing.

 

O amigo Pedrinho trazia numa das mãos um embornal com vários pés de alface, couve e cenouras e na outra mão, uma sacola de papel cheia de serragem. Ele nos contou que tudo aquilo era para receber o coelhinho da Páscoa em sua casa. Nós ouvíamos a história dele com muita atenção, aprendizado e uma dose de inveja. Os familiares iriam espalhar a serragem pela casa e sobre ela colocariam as hortaliças e as cenouras. Esse ritual seria para guiar o coelhinho da Páscoa que iria visitar sua casa à noite e deixar num canto dela “um ovo, dois ovos, três ovos assim, coelhinho da páscoa que cor eles têm azul, amarelo, vermelho também, azul, amarelo, vermelho também”.

A história contada pelo Pedrinho nos paralisou pela riqueza de detalhes e pelo conteúdo rico em simbologia. Os olhos de todos pareciam imantados diante dos seus argumentos. No final houve um silêncio sepulcral. Muitos desconheciam o ritual feito pelos familiares do Pedrinho. Depois descobrimos que em outras casas da rua também usavam o mesmo método. Percebi que só existia isso nas casas dos familiares ricos ou abonados.

 

Numa das mãos do pai do Pedrinho faltava parte de um dedo. Perguntávamos a ele o que ocasionou aquela perda. Ele sorridente e sagazmente respondia: “fui alimentar o meu coelho de estimação com uma cenoura e ele além de comê-la abocanhou o meu dedo comendo a metade dele”. História assustadora para nós crianças. Crescemos sem saber a verdade.

 

Diante das perplexidades dos coleguinhas, eu resolvi falar, falar e falar. Para começar eu disse a eles que essa história de coelhinho da Páscoa era tudo mentira, que coelhinho da Páscoa não existia e que nunca existiu. Que essa cena era para agradar os filhos. E continuei falando. Outra história mentirosa era a da cegonha que trazia os bebês pelo bico e entrava nas casas pelas chaminés. De repente a história do Coelhinho da Páscoa perdeu a vez pela da cegonha. Todos queriam saber mais detalhes sobre ela.

 

Eu lhes contei que a cegonha não trazia os bebês pela chaminé e provei cheio de maldade que bebês eram pesados para serem trazidos pelo bico de uma ave e que, se fossem jogados pela chaminé, ficariam pretos de cinzas e poderiam até morrerem intoxicados pela fumaça ou pelo fogo. As atenções voltaram para minha história. Chamei a atenção deles pelo tamanho da barriga das mulheres grávidas. Moacir perguntou: “Se o bebê não vem pelo bico da cegonha, então por onde ele vem?” Eu lhe respondi: os bebês vêm pela vagina (na época, usei outro termo impublicável). Depois de muitos risos incrédulos, perguntaram-me: “Como você sabe disso!” Respondi: Quem me contou foi a Dona Maria Parteira. Querem saber mais? Papai Noel também não existe.

 

Na minha casa, os ovos de Páscoa eram caseiros e feitos com 60% de prafina e 40% de chocolate em pó. Era considerado o melhor do mundo. É hábito comemoramos a Páscoa com mesas fartas de vinho, bacalhau e chocolate. A gente bebe e come para saudar, elevar e exaltar Jesus Cristo pela ressurreição e por estar hoje, em nossos corações e mentes. E os ovos de Páscoa? Os chineses costumavam distribuir ovos coloridos entre amigos, na primavera, como referência à renovação da vida. O ovo é ingrediente obrigatório na Páscoa. No século XVIII, a igreja adotou oficialmente o ovo como símbolo da ressurreição de Cristo, incorporando assim, um costume não cristão à comemoração. E o coelho? Ele representa a fertilidade no antigo Egito, por sua rapidez em se reproduzir, representa a fecundidade e a capacidade da igreja em multiplicar seus fiéis.

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