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Facturas argentinas

 Por Doutor Eric Júnior Costa, professor de línguas estrangeiras, pesquisador da temática migratória. Atualmente desenvolve pesquisas sobre a diáspora chinesa no Brasil, orientado por Dr. Delton Mendes Francelino, coordenador do Laboratório Internacional de Escrita Criativa e Científica.

Ele saiu de Caldas, no Ceará, sua cidade natal e chegou um pouco atrasado a São Paulo. Com ajuda de Cícero, seu amigo, programou e organizou a sua viagem. Destino? Buenos Aires. Chegou ao aeroporto de Congonhas. Deveria ter comprado a passagem para Guarulhos. Falha de Cícero? Quiçá. Em vez de reclamar, era melhor escolher uma das alternativas para pegar seu voo da Aerolíneas Argentinas. Opção 1: pegar um táxi, pagar muito caro, correr o risco de ficar bastante tempo preso no trânsito. Para que tudo corresse bem, era necessário torcer para que o Cícero, o outro, o de Juazeiro, ajudasse na tarefa. Opção 2 (para orçamentos baixos): pegar o metrô, fazer as baldeações até a estação Tatuapé para tomar um ônibus ao aeroporto de Guarulhos ou pegar o metrô, um trem e depois um ônibus até o mesmo destino. Decidiu pela primeira opção, apesar de pertencer ao grupo do orçamento limitado. Mal ele sabia que encontraria uma cidade com custos mais altos do que aqueles pensados por ele e Cícero, afinal o governo argento mudou trazendo falsas soluções e preços nas alturas. Contudo, deu tudo certo. Pagou uma fortuninha e foi.

Pegou o voo e desceu no Aeroporto de Ezeiza, en la loma del orto, isto é, longe para cara**o. Chegou ao seu hotel na Rua Suipacha, mero microcentro portenho. Não entendia bem espanhol, mas via muitas placas escritas “Promoción: 2 facturas y un café”, “Vení a probar nuestras ricas facturas”, “Docena de facturas con membrillo o crema pastelera”. Oxe, mas que diabo será isso de facturas? De tanto ver essas placas, decidiu se aproximar e observar do que se tratava. Entrou no comércio, cujo nome, escrito na parte de cima da porta dizia “Confitería Dulce Sabor”. Viu um mundo de doces, tortinhas, pães com açúcar, com creme, outros com algo vermelho em cima. Ah, comem goiabada aqui. Não sabia!, disse. No fundo vinha uma música que dizia inúmeras vezes “Luna de miel”, soava um rock argentino do século passado. Não entendia a letra, mas fazia sentido esse “miel” que cantavam. Pensou que significava mel e que esta palavra combinava bem com o que via em sua frente ao dar um giro de 360 graus. Era o paraíso dos melhores pães doces da sua vida. Pediu a Cícero que o ajudasse a escolher um só e que deixasse a gula de lado. Impossível. Era como um vírus novo, um vício que tomava conta pouco a pouco de sua visão, dos seus desejos. Luna de miel. Os doces, tortas e tortinhas brilhavam mais e mais, ele era tomado por um desejo de sentar e comer tudo. Viu uns croissants ao mesmo tempo que uma cliente ao lado apontava para esses mesmos croissants e perguntava algo sobre medialunas. Medialunas? Luna de miel? Algumas tortinhas tinham morango, outras algo amarelo, tipo um creme, algumas chocolate. Viu algo como pão de mel (um argentino lhe diria: alfajor, boludo!), viu doce de leite, viu pães com muitos detalhes, dobradinhos, enroladinhos. Estava possuído pelo novo vírus em sua vida, era da velocidade do cometa halley, deliciosa sensação como uma luna de miel. Decidiu comprar. Cumprimentou a funcionária com um seco “hola”. Ela gentilmente perguntou se queria as facturas que ele tanto observava. Já babava? Disse em português mesmo que queria uma com o creme amarelo (crema pastelera, boludo!) e mais uma com essa goiabada.

 

– Goiabada? perguntou a funcionária.

– Sim, disse ele.

– Ah, no…es membrillo, disse a garota.

– Membrillo? Que isso?

 Então, ela lhe mostrou a foto e a tradução pelo celular. Ahhh, era marmelo. Sim, marmelo, marmelada da Vovó Preta Tia Simoa, aquela dos Jangadeiros de Fortaleza. Comprou meia dúzia desses pães (facturas, boludo!) e dois croissants (medialuna, boludo!). A música ainda tocava no fundo, luna de miel, luna de miel. Pagou pelas facturas e decidiu perguntar quem cantava aquela música. A funcionária disse que era de uma banda muito famosa dos anos 80 que se chamava Vírus.

 Juiz de Fora, 23 de maio de 2025.

Eric 海岸

 

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