O som da liberdade

Por Francisco Santana

Da janela do meu quarto vislumbro todas as manhãs uma paisagem que faz bem ao meu corpo, mente e espírito.  Contemplo-a com atenção e curiosidade. São muros divisando casas vizinhas e sobre eles, concertinas reforçadas e cortantes. Ontem, essa paisagem foi enriquecida visualmente com as presenças de 12 canários da terra e de quatro maritacas de lindas cores fazendo uma algazarra parecendo querer acordar os vizinhos clamando-os para o início de mais um dia de trabalho. Os canários se acotovelavam para se protegerem do forte frio que assola Barbacena.

 

Admirei por instantes essa obra divina moldada pela natureza. Tentei o registro fotográfico, mas não fui cauteloso e afugentei os pássaros. Retornei ao local inicial, minha janela lateral e já imaginei outras imagens. As concertinas me levaram aos idos anos 1941 – 1945 e as vi protegendo os muros dos campos de concentrações nazistas. Os canários e as maritacas cederam seus lugares aos abutres que espreitavam seres humanos mortos para se apropriarem de seus restos mortais. Seus cantos festejavam a liberdade e nos campos, os cantos eram de lamentos pelos seus fins iminentes. O que antes era uma mensagem de alegria se transformou em tristeza. 

 

É impossível observar as concertinas sem pensar no holocausto que foi a perseguição nazista e o extermínio de mais de seis milhões de judeus pela Alemanha e seus então colaboradores. “Holocausto” é uma palavra de origem grega que significa “sacrifício pelo fogo”. Além dos judeus, foram perseguidos e sacrificados eslavos, poloneses, ciganos, prisioneiros de guerra soviéticos, deficientes físicos e mentais, homossexuais, maçons e testemunhas de Jeová. Uma característica marcante do genocídio nazista foi o uso extenso  e cruel de seres humanos em experiências médicas.

Quem nunca ouviu falar do médico Dr. Josef Mengele? Ele trabalhou no mais famoso campo de concentração nazista de Auschwitz. “Seus experimentos incluíam colocar os “objetos” de pesquisa em câmaras de pressão, testar drogas neles, congelá-los e, na tentativa de mudar a cor dos olhos, injetar substâncias químicas nos olhos de crianças, além de várias amputações e outros tipos de cirurgias. Os indivíduos que sobreviveram aos experimentos de Mengele eram quase sempre mortos e dissecados logo depois. Ele realizou muitos experimentos com crianças ciganas. Ele trazia doces e brinquedos para elas e pessoalmente levava-as para a câmara de gás. Elas o chamavam de “Onkel (tio) Mengele”. Vera Alexander foi uma prisioneira judia em Auschwitz que cuidou de 50 pares de gêmeos ciganos: 

“Lembro-me de um par de gêmeos em especial: Guido e Ina, com cerca de quatro anos. Um dia, Mengele levou-os. Quando eles voltaram, estavam em um estado terrível: eles haviam sido costurados, entre as costas, como gêmeos siameses. Suas feridas ficaram infectadas e escorriam pus. Eles gritavam dia e noite. Então seus pais — eu lembro que Stella era o nome da mãe — conseguiram um pouco de morfina e mataram as crianças, para acabar com seus sofrimentos”. 

Para ser livre, não basta ao homem a liberdade de se locomover. Faço alusão àquela liberdade onde o homem não é dominado pela torpeza de seus instintos animais e escravizado pelos vícios.  Não precisamos de ninguém para sermos livres. Nossos pensamentos, sentimentos e ações devem fluir de dentro para fora. Não é livre quem depende da conduta alheia. Só aquele que se faz livre de verdade sabe o que é o amor. O escravo do pensar e do sentir nunca saberá o que é o amor. 

A nossa independência é mais abrangente e encontrei subsídio num parecer inserido num manual maçônico que nos ensina que devemos levantar templos à virtude, cavar masmorras aos vícios, vencer paixões, submeter vontades, desenvolver interiormente e estreitar laços fraternos. Isso é crescimento, isso é liberdade, isso é independência. 

Janela do meu quarto, muros, concertinas, pássaros, cantos, guerras, nazismo, campos de concentrações, perseguições nazistas, experimentos científicos, crueldade, holocausto, perseguições e mortes. Muito me alegrou o cantar de liberdade dos pássaros, muito me entristeceu ao me lembrar do holocausto nazista que exterminou milhões de vidas. 

(Fonte: Wikipédia/Internet).