Pauta em prosa, verso em trova (Volume 83)

JGHeleno*

 

Convido vocês a ouvirem a música que se segue. Minha análise aqui não é da canção em sua totalidade, mas apenas da letra, que eu vejo como um poema. Sem nenhuma ousadia. Na origem, letra e melodia eram executadas juntas, incluindo a dança. A melodia acentua a expressividade do texto, por isso sugiro a audição. Eu costumo excluir as partes repetidas.

 

 

 

Linda Demais

Canção de Roupa Nova

Linda, só você me fascina
Te desejo muito além do prazer
Vista meu futuro em teu corpo
E me ama como eu amo você

Vem fazer diferente
O que mais ninguém faz
Faz parte de mim
Me inventa outra vez

Vem conquistar meu mundo
Dividir o que é seu
Mil beijos de amor em muitos lençóis
Só eu e você

Linda, conte a mim teu segredo
Pro meu sonho, diga quem é você
Livre, nunca mais tenha medo
Pois quem ama, tudo pode vencer

Oh, linda

Linda, conte a mim teu segredo
Pro meu sonho, diga quem é você
Livre, nunca mais tenha medo

Fonte: Musixmatch

Compositores: Luiz Octavio Paes De Oliveira / Eustaquio Pereira Neto

Letra de Linda Demais © Universal Mus. Publishing Mgb Brasil Ltd, Sony Music Publishing (brazil) Edicoes Musica

 

É um poema em que o amante se dirige à sua amada num misto de amor denso e amor tênue. Há momentos de declaração densa e outros de declaração tênue. Por isso é um amor rico e bonito. Em certo momento, o convívio amoroso é despojado, quando o poeta diz que seu amor não se reduz ao prazer pessoal.

Logo na primeira estrofe o poeta provoca o leitor/ouvinte com uma frase enigmática dirigida à amada: “Vista meu futuro em teu corpo”. É uma frase metafórica. A metáfora tem o dom de ampliar os sentidos. Neste caso aqui, a metáfora é também uma provocação, porque leva a amada a remoer-se sobre o sentido que a frase esconde. “E me ama como eu amo você”. Ele pede, com essas palavras, que o universo interior da amada ocupe todo o seu próprio universo de amante, gerando uma coincidência máxima entre eles.  É um diálogo que vai além da troca de mensagens individuais denotativas e parte para o diálogo muito mais amplo entre seus universos, com tudo o que isso implica. A metáfora tem o dom de multiplicar os entrelaçamentos de ideias e de sentimentos nos universos dos amantes,  e entre o artista criador e o artista fruidor do poema.

“Me inventa outra vez”, pede o amante. Ou seja: me crie dentro de você. Ao invés de me ver como um homem objeto comum, exterior, me recrie, me incorpore ao seu universo interior, me misture no seu mundo, me devore, de certa maneira, e me assimile como parte do seu mundo.

Depois de me colocar para dentro do seu universo – quer expressar o amante – venha agora até o meu universo e o conquiste, tome posse dele, faça parte desse meu universo que já é seu por doação da minha parte: “Vem conquistar o meu mundo, dividir o que já é seu”. Diga quem é você, me conte o seu segredo, enfim: me abra o seu mundo.

“Livre, nunca mais tenha medo” é a frase desafio. Segundo os estoicos o amor denso não liberta, porque o fascínio aprisiona e deixa que o  objeto (a pessoa amada) domine o sujeito amante. Na linguagem corrente: o amor é cego. Para o estoico, o amor tênue (a amizade) sim, é aquele amor que mantém o amante livre porque o deixa seguir sua razão. Termino com uma pergunta: o amor liberta? Como? (Não me comprometam: não estou afirmando nem negando… Vocês com a bola!).

 

Como tudo acaba em trova (lá vai o desafio):

 

 

Quando o amor é só instinto,

ele está preso na veia,

quer arrebentar o cinto,

pois o cinto é sua peia.

 

Quando o amor é liberdade

e é súdito da razão,

com certa serenidade

se parte pro amor, ou não.

 

 

*ABL, AJL, UBT, LEIAJF

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