JGHeleno*
O COBRADOR (I)
Ele pôs a maleta no chão para pensar melhor. Enquanto ia ao trabalho, lembrou-se do livro de Esther Paniagua, e nunca desejou tão firmemente que começasse ali, naquele lugar, sem que ele tivesse tempo de mais um passo sequer. Caísse um apagão definitivo na rede mundial de computadores. “Assusto-me por ver como envelheci. Em 1986, quando Esther nasceu, eu já escrevia livros, e não produzi até hoje o livro que sempre quis”. Pensou sem ter coragem de tirar o pé do lugar, pois sabia que o teria que botar à frente, e computar o tempo que gastaria para isso, e a fração de vida que lhe ia embora. E ele não tinha ainda escrito o livro que sempre quis. Isto era o que lhe entrevava os passos.
Era cobrador de dívidas perdidas. Negociar, negociar, parcelar. Sempre fazendo maus negócios segundo seu patrão, o agiota, que não cansava de contar dinheiro. Extorquir quem não pagou porque não pôde… sangrá-lo em suaves prestações. Pagar, para poder endividar-se novamente. Daqui a pouco, não tão pouco assim, ele ia abrir de novo o laptop, diante de alguém de olhos estatelados. Vinha-lhe à lembrança o cofrinho de guardar espoletas na coronha da arma de seu pai caçador. Mais modesta, a espingarda tinha um olho só. Essa lembrança era pertinente, pois que tendo um olho só, ela chorava menos. (JGHeleno; continua na próxima semana)
Aquele que apela a juro
alegando estar quebrado
fecha o olho pro futuro
quando há de se ver pelado
· ABL, AJL, UBT
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