O poder da sedução

A crônica de Francisco Santana

Por Francisco de Santana

Era uma convenção. O auditório da faculdade estava totalmente lotado. Todos para ouvir um renomado orador, conhecido pela sua capacidade de encantamento e persuasão. Eu tive o privilégio de estar bem próximo dele trabalhando como Mestre de Cerimônias.  Ao chamá-lo, a plateia o aplaudiu de pé por vários minutos.  

Eu estava empolgado, pois adoro gente que nos manipula com perfeição e nos seduz com palavras. Sua voz era forte, vibrante, sua dicção era perfeita e ele, muito carismático. A minha expectativa se transformou em decepção. Fui iludido pela propaganda enganosa. O seu discurso deixou a desejar, pobre em conteúdo e o assunto fugiu totalmente do anunciado. Para impressionar e se mostrar sábio, ele utilizou de palavras bonitas, complicadas, muito termo latino e citações filosóficas. O seu discurso era uma miscelânea. Compartilhei o meu parecer com vários amigos e obtive a seguinte resposta: “Não captei nada do que ele disse, mas ele falou tão bem e tão bonito que compensou o tempo que fiquei aqui para ouví-lo.

O que distingue um bom discurso de um mau discurso? A oratória. Um bom orador já nasce com o dom e se aprimora com as técnicas. Temos a mania de nos empolgar e endeusar aqueles que nos seduzem pelas palavras.  Devemos ficar alertas para não sermos iludidos ou convencidos pelo palavreado que muitos oradores falam muito e não dizem nada. Ato comum na classe política.  

O jornalista Reinaldo Polito escreveu em sua coluna algumas dicas interessantes para um bom discurso: “Treine bastante sempre que tiver de se apresentar. Se escrever o que pretende falar, tenha certeza de que irá entender perfeitamente as próprias anotações. Use letras em corpo grande para ler sem dificuldade Mesmo que faça anotações, tenha boa noção do assunto que irá expor. Se ocorrer algum problema, terá condições de fazer algum comentário Nunca fale de maneira precipitada. Às vezes, alguns segundos podem ser suficientes para que inicie com domínio total da situação Pratique falar de improviso toda mensagem que pretende comunicar com apoio de anotações Se estiver muito nervoso, comece falando mais baixo e mais devagar para que a instabilidade não seja percebida.. Ah, nunca confie na memória para cumprimentar os componentes da mesa, leve os nomes anotados em uma folha de papel E se der branco no meio da apresentação, use esta frase mágica: “na verdade o que eu quero dizer é…”.Você se obrigará a recontar o assunto por um novo caminho e se livrará do problema. 

Meu professor de filosofia já dizia: “Falar bonito envaidece o rei, assusta o sábio e confunde até o ladrão”. Analisemos essa história.

Ao chegar à sua casa, Rui Barbosa ouviu um barulho estranho vindo do quintal. Chegando lá, constatou haver um ladrão tentando levar os patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com as amadas penosas, e grita: 

– Oh, bucéfalo anácrono! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo; mas se é para zombares da minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à qüinquagésima potência que o vulgo denomina nada.

O ladrão, confuso, perguntou:
– Doutor, eu levo ou deixo os patos?

Ainda hoje idolatramos pessoas que falam bonito. Suas palavras nos empolgam. A fluência verbal abre portas, caminhos e nos conquista. Fico a pensar a cara do pobre ladrão ao ouvir os vocábulos complicados ditos pelo Rui Barbosa. 

(Fonte: Internet/Coluna jornalista Reinaldo Polito).

Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao utilizar nossos serviços, você concorda com tal monitoramento. Aceitar Saiba Mais