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A Casa de Deus é para todos?

… “Tá vendo aquela igreja, moço? Onde o padre diz amém. Pus o sino e o badalo. Enchi minha mão de calo. Lá eu trabalhei também. Lá sim valeu a pena. Tem quermesse, tem novena. E o padre me deixa entrar…”

A letra dessa canção que tanto emociona e suscita a nossa dignidade, me veio ao pensamento certo dia em que eu presenciei uma cena que muito me impressionou.

Eu estava em Belo Horizonte e fui assistir à missa dominical numa igreja muito frequentada e de destaque no centro da cidade. Sentei-me num banco da lateral, pois os demais já estavam ocupados. Logo adiante, também na lateral, um homem sujo, malcheiroso e com sinais de que havia ingerido bebida alcoólica também se sentou. Estava quieto, com os olhos semicerrados. Eu prestei a atenção nele. Os cristãos à sua volta o olhavam com repulsa, principalmente por causa do odor que exalava. Houve cochichos e apontamentos para ele. De minha parte, eu censurei o fato de ele ter colocado um dos pés no banco. Afinal, no banco da igreja ou de qualquer outro lugar público não é para ser colocado os pés e tem muita gente precisando aprender isso e ensinar às crianças. Nos bancos todos nós nos sentamos.

Bem, o cidadão estava lá, sem fazer alarde ou perturbar, mas veio um homem truculento, vestido com um uniforme escuro e o pegou pelo braço com a maior grosseria, exigindo que ele saísse da igreja. Aquilo me encheu de indignação e eu queria entender o motivo de aquele homem estar sendo tirado da igreja daquela forma, uma vez que excetuando os seus trajes que contrastavam com os das demais pessoas, ele não estava incomodando ninguém e nem atrapalhando o rito que, àquela altura, já havia começado. Pude deduzir: a presença do homem aborrecia as madames e os lordes que lá se encontravam com sua triste figura. Fiquei com muita raiva daquilo e fui atrás do homem que havia tirado o outro, arrastando-o para fora. Imaginei que talvez ele fosse agredir o maltrapilho. Pelo menos isso não aconteceu até quando eu pude acompanhar, mas o homem xingava o outro que estava dominado  e apontava o dedo em riste para ele, provavelmente o ameaçando para não entrar de novo na igreja.

Voltei para o meu lugar e a missa naquele dia teve um outro significado para mim. Fiquei sem concentração e não parava de pensar no ocorrido. Confesso que até aquele dia eu não sabia que havia seguranças na igreja, nunca havia presenciado nenhum fato que o justificasse. Agora sei que no Santuário de Aparecida, por exemplo, há muitos, vários seguranças, mas é o templo católico de maior importância do Brasil e lá dentro há todo um histórico e peças valiosas. Fiquei com pena daquele homem e incomodada com a forma indigna como foi tratado e o que é pior: dentro de uma igreja. Uma característica minha é não suportar que alguém seja humilhado ou constrangido na minha frente. De fato, me incomoda sobremaneira.

Daí eu fiz a analogia com a música Cidadão, que em sua letra fala dos lugares em que o trabalhador não pode entrar, embora tenha trabalhado na sua edificação, mas isenta a igreja porque ali é a Casa de Deus, cuja entrada é permitida a todos. Contudo, não foi o que eu presenciei naquele momento.

Nas igrejas, templos ou espaços religiosos de qualquer doutrina religiosa é comum ver as pessoas orando, ajoelhadas, emocionadas, parecendo suplicar as bênçãos que precisam alcançar. Chegam, se sentam, ficam em silêncio em busca de um pouco de paz, tentando se conectar ao Criador. Nunca foi proibido, milhares de pessoas passam todos os dias por bancos de igrejas pelos mais diferentes motivos, seja para pedir ou agradecer.

Pelo menos é o que concluimos: na igreja entra o bacana e o simples, o bem e o mal vestido, o centrado e o perturbado. Até os cachorros entram, cheiram tudo, percorrem todos os espaços e, às vezes, protagonizam momentos hilários com os sacerdotes. Há até um ditado para eles “O cachorro só entra na igreja quando encontra a porta aberta”. Ou seja, é um espaço bem democrático e permitido a todos, mesmo que alguns não entendam o seu real significado e grandeza.

Dessa maneira, eu não me conformei em ver naquele domingo, dentro da Casa de Deus, um cidadão ter sido tirado à força de um banco da igreja, sendo que ele não oferecia perigo e não atrapalhava ninguém.

É sabido que atualmente, infelizmente, muitas igrejas passam a maior parte do tempo fechadas, com horários determinados para receber as pessoas que ali desejam estar. Isso, devido à violência que também chegou à igreja através de roubos de suas valiosas peças e doações. Um sacrilégio, a meu ver, a exemplo do que acontece com roubos em escolas.

Mas o homem que foi arrastado para fora da igreja naquele dia em Belo Horizonte estava desarmado, não portava nada a não ser a sua infeliz figura com o pé no banco. Fiquei me perguntando se o sacerdote viu aquilo ou se seria de sua aprovação um fiel ser tirado da Casa de Deus daquela forma.

Mas daí vem o consolo de Cristo na letra da música quando diz para o homem que não era para ele ficar tão magoado, pois Ele mesmo, apesar de ter criado tudo que existe no mundo, na maioria das casas também não podia entrar.

 

Maria Solange Lucindo Magno, professora dos anos iniciais do Ensino Fundamental na rede estadual – aposentada

Atuou como Inspetora Escolar na rede estadual – SEE

Técnica em Educação da rede municipal de ensino de Barbacena – aposentada

Amante de livros, cinema, teatro e música, enveredou pelos caminhos da escrita

Lançou em 2020 o seu livro de caráter intimista “Escritos Com o Coração”

Autora de diversas crônicas

Possui publicações na plataforma Scriv

Comentarista na página do Leitor – Revista Veja

Foi aprovada como colunista do site O Segredo

Aprovada em cinco Antologias

Atualmente é articulista do Complexo de mídia eletrônica Barbacena Online

Instagram: @mariasolluc

Facebook: Maria Solange Lucindo Magno

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