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Pauta em prosa, verso em trova (volume 109)

JGHeleno*

 

Ao padre Marcos Furtado

 

Às musas sou hostil, por femininas;

não quadram poesia e breviário,

é isto o que me diz o bom vigário

do Travessão, paróquia destas Minas.

 

Se as musas vestem saia e são meninas,

que importa aos formigões do Seminário

que as nove irmãs não dessem a inventário

nem os nós nem as barbas masculinas ?!

 

Quem ler o Stabat mater dolorosa,

verá que a poesia, além da prosa,

no ripanço e missal tem cabimento.

 

Se aos padrecas é ingrato a meu aspeito,

eu os vou aspergindo, pois suspeito

que o demo lhes perturba o entendimento.

 

Esse poema é da obra Puerilidade de um macróbio, Rio de Janeiro: Laemmert & C. , 1898, p. 79)

 

Nsse poema CA se mostra grande conhecedor da língua portuguesa. A leitura exige pesquisa sobre o sentido de alguns termos, por pertencerem a um campo semântico especificamente religioso católico.

Um pequeno glossário facilita a leitura: breviário: livro litúrgico que contém orações e outros textos sagrados, conforme o calendário católico e as horas canônicas. É um livro que os padres normalmente lêem todos os dias. Lê-lo é  parte da sua rotina diária; formigões: apelido frequentemente aplicado aos seminaristas; Stabat Mater dolorosa: canto sagrado, em latim, que se costuma cantar na semana santa. Tradução: “A Mãe dolorosa permanecia de pé (junto à cruz); ripanço: manual que contém os rituais da semana santa; missal: livro com os textos das missas diárias e de outros rituais; aspeito: palavra deriva do verbo latino adspicere. Equivale a  “admoestação”.

 

A sátira, neste poema, se mostra bastante ousada, praticando, ao pé da letra,  aquilo que ele preconiza em outro poema: “Dos louvores da lisonja/ desvio meu pensamento;/ somente ao Deus dos exércitos/ hosana tem cabimento.”  Ele diz que sua sátira é direcionada a qualquer pessoa, independente do status cidadão do alvo. Nesse poema, ele responde a um colega de ofício clerical, pondo de lado qualquer tipo de consideração, até a solidariedade confessional e laboral. O alvo é um padre como ele. Não poupa o seminário, não poupa os seminaristas. Ele termina o poema aspergindo a água benta sobre o poeta-padre, como que exorcizando dele o demônio que se encontra, não no texto, mas na própria cabeça infetada de maldade do padre poeta crítico. Assim ele usa a água benta para livrar do demônio, não o texto poético de sua autoria, mas a mente do padre poeta que o critica.

 

O padre Marcos tinha dirigido a Correia de Almeida um soneto manifestando discordância  quanto às referências elogiosas às musas, e reprovação às sátiras impiedosas contra  os padres. (Às musas sou hostil, por femininas;/ não quadram poesia e breviário). A isso ele responde que a maldade não está nos poemas, mas na cabeça do padre leitor de sua obra.

Vou arriscar aqui uma explicação do ostracismo em que se encontra a obra do Padre Mestre Correia de Almeida. É seguir ao pé da letra o que ele próprio diz de sua postura satírica: : “Dos louvores da lisonja/ desvio meu pensamento;/ somente ao Deus dos exércitos/ hosana tem cabimento.”

 

 

Para terminar em trova:

 

A sátira literária

faz bem à sociedade

mas em direção contrária

não faz bem à amizade. (JGHeleno)

 

* ABL, AJL, LEIAJF, UBPA, UBT

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