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Pauta em prosa, verso em trova (volume 95)

JGHeleno*

 

A leitura de qualquer poesia é geralmente uma leitura vagarosa. Isso porque ler poesia é refletir. Não é como ler uma narrativa, mesmo quando se trata de uma história criativa como um romance ou um conto. Na leitura de um poema não há passividade. Você não consegue pôr em lados opostos o poeta criador do poema como narrador sujeito, e o leitor como simples receptor de mensagem. Na verdade, o leitor se vale de um texto proposto pelo poeta criador, e o recria dentro de seu próprio universo. As leituras diversas de um poema encontram sentidos diferentes em cada leitor diferente porque as expressões que o poeta usa em seu poema encontram universos diferentes em cada leitor.

Dou um exemplo. “O silêncio faz barulho/ Deixei meu coração/ aninhado no intervalo/ entre duas notas musicais” (Trindade, p. 18)

Cada uma das palavras que aparece na estrofe acima traz a todos os leitores uma ideia comum: o que é silêncio, o que é barulho, o que intervalo. Mas, para cada leitor individualmente, a palavra silêncio arrasta consigo conotações variadas (as maneiras como essa palavra mexe com o íntimo do leitor). Isso depende do que significa para o leitor essa palavra. Depende também do que essa palavra traz à lembrança do leitor. O que se diz do “silêncio” pode-se dizer de todas as palavras daquela estrofe, de todas as palavras do poema, de todas as ideias que o leitor pode associar à palavra “silêncio”. Assim, ler o poema é deixar que a livre associação de ideias povoe o universo do leitor, é não se aprisionar no sentido corriqueiro das palavras e das expressões que constituem o poema. O poeta, ao povoar de contradições a sua obra, ou povoá-la de sentidos ambíguos ou muitas vezes ocultos, está dando uma sacudidela no leitor e lembrando-lhe que o que interessa não é o significado restritivo das palavras ou expressões de seu poema, mas aquilo que elas podem provocar nele, leitor.

Você talvez não conheça o poeta autor da estrofe acima, Luiz Henrique Trindade, da Academia Barbacenense de Letras. Isso, porque, como a maioria  de nós, que escrevemos e lemos poesias, ele não é consagrado pela grande mídia. Mas ser ou não ser consagrado pela grande mídia não significa que o poeta e sua poesia tenham ou não tenham qualidade poética. O poeta faz poesia, e o leitor lê poesia porque, de dentro dele, emerge uma ânsia que o leva obrigatoriamente a se expressar tanto pela criação quanto pela fruição poética. O que leva a grande mídia a consagrar um poeta e sua obra não é necessariamente a qualidade. Inclui-se aí uma série de outras circunstâncias: vencer concursos, cair nas graças dos grandes meios de comunicação, criar e publicar regularmente, coisas que nem sempre refletem qualidade.

Luiz H. Trindade é autor do livro “Um pássaro na noite”.  O convite à reflexão poética é sempre muito intenso em qualquer poema. Neste não é diferente, ainda mais porque se trata de um grande poeta. A título de exemplo, cito aqui, principalmente, elementos contraditórios. As contradições remetem sempre a algo maior, a infinitos, a universais. Luz/corpo, terra/ar, corpo/alma, presente/passado, terra/céu são alguns exemplos, sendo a oposição claro/escuro a dominante em todo o livro.

(TRINDADE, Luís Henrique. “Um pássaro na noite”. Rio de Janeiro: Litteris, 1997,48 p.)

 

Para terminar em trova:

 

No meio da criação

errado às vezes é o certo

já que para a criação

sentido é sempre algo aberto (JGHeleno)

* ABL, AJL, LEIAJF, UBPA, UBT

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