Por JGHeleno*
Vou focar mais uma vez um poema de Correia de Almeida. Mas quero um poema que fuja a seu rótulo de poeta satírico. Sim, de fato ele é um poeta satírico, e ele tem consciência disso. Um poeta que publica mais de vinte livros de poesia, certamente não se atém apenas a um gênero poético. Vamos, pois, ler o poema:
Soneto
Epígrafe: “Presunção e água benta cada um toma o quanto quer (Anexim)”
Sei que não sou poeta delicado,
sentimental, de estética e de amores,
aplaudido por dar o seu recado
redundante de tropos e de flores.
Sei que não sei fazer versos de eirado,
inefáveis delícias dos leitores,
sobretudo se é neles apurado
o gosto dos artísticos lavores.
Sei que, se o tenho, o mérito é somenos
e acima de mim vejo esses amenos
petrarcas de que a turba faz alarde.
Mas também sei, e isso é o que me anima,
que as verdades que digo em metro e rima
registradas estão para mais tarde
((ALMEIDA. José Joaquim Correia de. Puerilidades de um macróbio. Rio de Janeiro: Laemert. e C. Livreiros, 1898, 1).
Nas duas primeiras estrofes, C.A. diz o que ele não é: não é um poeta delicado, sentimental ou lírico. Seus poemas não são atraentes por seus lances de puro-gosto e elaborações poéticas.
Nas duas últimas, ele diz que, apesar de todas essas “restrições”, ele reconhece em si algum mérito: o mérito da punição moral (própria da sátira), e o reconhecimento futuro de sua qualidade poética.
Ele deixa claro que a sátira é uma opção pessoal, não resultado de uma incapacidade de criar poemas de outros gêneros.
Há aqui também uma espécie de balanço de sua vida dedicada à literatura. Ele conclui que vale a pena. Pelo menos a imortalidade poética já lhe está garantida. “Isso é o que me anima”, pois seu reconhecimento terá continuidade mais tarde. Ele sabe que é sonetista, mas afirma que seu soneto não tem a envergadura de um poema de Petrarca, o poeta italiano criador do soneto no século XIV. A evocação desse nome, justaposto ao seu, não deixa de ser uma afirmação sutil segundo a qual, mesmo não sendo equiparável a Petrarca, ele não se julga um poeta desimportante.
Para terminar em trova:
Pra ser imortal poeta
Correia mira Petrarca
tendo-o sempre por meta
evitando a morte Parca. (JGHeleno)
. * ABL, AJL, LEIAJF, UBPA, UBT
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