– Oi Santana, tudo bem? Eu sou a Grazi, sua amiga virtual e conterrânea. Nasci em Barbacena e me mudei para Caxias do Sul quando tinha 14 anos. Nos diálogos com as amigas, sempre o nome Barbacena vem à baila. Elas ficam encantadas com as minhas histórias. Há semanas, uma delas me mostrou uma programação de viagem às cidades históricas de Minas Gerais e não constava o nome de Barbacena. Fiquei triste com a informação da agência de turismo: inviabilidade. O que aconteceu com a nossa BQ – Barbacena Querida?
E continuou:
– Barbacena tem a alcunha de “Cidade das Rosas”. Eu me lembro dos desfiles pomposos com carros alegóricos enfeitados com rosas de diversas cores, muita beleza, muita flagrância onde as rainhas e princesas desfilavam com garbo e emoção. A cidade era alvo das atenções de turistas do Brasil inteiro, hotéis lotados e a cidade em festa. Ainda sobre as rosas, conheci plantações que me enchiam de orgulho em saber que o mundo inteiro iria conhecer a “rosa” de minha terra natal. O nosso entusiasmo era geral e tínhamos a alegria de propagar o evento e a rosa em geral. Aqui em Caxias recebi de presente um buquê de rosas e entre elas algumas da cor preta. Eu me rendi a essa raridade e principalmente, por saber que vieram de Barbacena. Como está a cidade hoje no tocante às rosas?
– Os tais desfiles garbosos acabaram. Há festas isoladas no parque de exposições com menos glamour. As plantações em massa mudaram de cidade, aquelas empresas de comercialização fecharam. As Rosas de Barbacena ficaram restritas a algumas mulheres que andam pelas ruas em companhia das Margaridas, Hortências, Violetas, Yasmins, Açucenas, Petunias, Florindas, Floras e Magnólias. O maior e melhor hotel da cidade encerrou suas atividades. Todos perguntam o porquê e não sabemos explicar.
– Que pecado! Eu adorava ir ao cinema com minhas colegas. Quando cheguei ao sul do país, comentei com as novas colegas sobre os cines Pálace, Orfeu e Apolo. Elas acharam isso o máximo, uma cidade nem tão grande com três bons cinemas.
– Sinto lhe dizer que os três se fecharam há tempo. Eles vivem de aparições em grupos de internet como lembranças de fotos antigas. Hoje contamos com os cines Plaza e Art.
– Meu Deus, minha BQ está desfigurada, Santana! Pelo menos a Escola Preparatória de Cadetes do Ar ainda existe? Depois de alguns anos fiquei sabendo de um cadete ilustre que estudou na EPCAR. Seu nome era Ronaldo Nogueira ou “Pequeno Príncipe” ou artisticamente, “Ronnie Von”. Que frisson ele ainda nos causa.
– Finalmente, um sim. A EPCAR, como é conhecida, funciona a todo vapor nos orgulhando e mostrando ao mundo pilotos aqui formados. Geograficamente, estamos pertinho da localidade de Cabangu, Santos Dumont, terra natal do Alberto Santos Dumont, o pai da aviação.
– O nosso projeto era irmos de avião até Barbacena, pernoitar e depois fazer nossas visitas às outras cidades de ônibus. Essa hipótese foi descartada, pois nos informaram que o aeroporto de Barbacena não recebe alguns tipos de aviões. Como assim? Fiquei indignada. Como pode uma cidade com Escola Preparatória de Cadetes do Ar e não receber alguns tipos de aviões. Ela deveria ser o exemplo, o modelo de aeroporto. O que você pode me dizer?
– Paradoxo.
– Seu humor malicioso e inteligente me encanta, Santana. Se não tem aí viagens pelo ar, como estão as estradas por terra e por trilhos? Eu me lembro de memoráveis viagens de trem de Barbacena a São João Del Rei, Cabangu, Santos Dumont, Juiz de Fora e Rio de Janeiro. Como está hoje?
– Como em todo país, alguns trechos oferecem perigos onde o maior deles se chama imprudência dos motoristas. Sobre as viagens férreas eram realizadas nos bons tempos que não voltam mais. Elas aquecem nossos corações trazendo lindas recordações. Doces lembranças. O que restou é a viagem da “Maria Fumaça” de Tiradentes a São João Del Rei. Viagem curta que nos alegra.
– Meu pai amava futebol e eu sempre ia aos jogos com ele. Conheci todos os campos de futebol de Barbacena. Vamos conferir? Andaraí, Independente, Olimpic, Vila do Carmo e América. Acertei? Lembrei-me do futebol porque assisti semana passada o filme “Heleno” e sei que ele ficou internado num sanatório em Barbacena e morreu aí.
– Futebol profissional acabou. Os campos do Andaraí, Vila do Carmo e Olimpic ainda existem, porém sem atrações. Quem viu, viu. Quem não viu, ouça as histórias contadas pelos mais velhos. A prática do futebol ficou restrita ao amadorismo de algumas localidades, bairros e sedes campestres. O referido Sanatório que ficou famoso pelo filme “Heleno” que narra a vida do advogado, craque problemático, catimbeiro, boa vida, irritadiço, intratável e galã Heleno de Freitas, foi tombado literalmente, todo destruído onde uma obra gigantesca está sendo construída. Dizem que é para servir de faculdade.
– Andavam pela cidade algumas figuras estranhas que entraram para a história de Barbacena. Seriam folclóricas? Elas fizeram parte da minha vida e da minha história. Suas purezas, iras, gritos, choros, trejeitos e ações contagiavam a população que os admirava e nos causava emoções fortes. Não vou citar nomes para não ser injusta. Pelo tempo, acredito que todos já morreram. Que história é essa de um novo “folclore” que está fazendo sucesso aí sendo até chamado de Mikhail Baryshnikov e de Fred Astaire? Estou curiosa, me conta?
– Grazi, todos se mudaram para o planeta chamado de sonho e saudade. A figura que você questiona é a do nosso jovem prefeito municipal que sem nenhuma timidez se apresenta nas festas populares com seu gingado, requebro, bailado, dança da bundinha e da garrafa para o delírio da meninada que vê nele um deus “Apolo”, “Adônis” ou “Narciso”. Eu só o vi dançando em vídeos e acho que ele está mais para o jacaré, ex “É o tchan”. Vai entrar para a história como o prefeito bailarino.
– Gostei muito do seu relato, amigo Santana. Venha nos visitar aqui no sul, será um prazer recepcioná-lo!
– Minha gratidão pelo convite. Que vocês façam uma ótima excursão e aproveitem as maravilhas das cidades de Belo Horizonte, Sabará, Diamantina, Cerro, Mariana, Ouro Preto, Congonhas, Tiradentes e São João Del Rei. Cidades esplendorosas. Reservem tempos para se encantarem com as belezas naturais e feitas pelos artistas renomados. Nossa Barbacena querida parou no tempo. Ela está esquecida pelos nossos mandatários, preocupados em alimentar cada vez mais seus egos. Barbacena não merece ficar no ostracismo. Quando se pergunta pelas atrações turísticas apenas nos lembramos das igrejas monumentais de vários etilos, Museu da Loucura para sempre nos lembrar do holocausto que matou centenas de pessoas, Jardim do Globo/Jardim Suspenso, prédio da Escola Preparatória de Cadetes do Ar e do Instituto Federal Sudeste de Minas Gerais – Campus Barbacena. Acabaram com o nosso carnaval, festas juninas, fábricas de tecidos, de meia e com a sericícola onde se cultivava o bicho da seda para fazer o tecido e com o nosso futebol que já disputou a 1ª divisão do campeonato mineiro. Eu tive um colega de nome Jacaré (que bocão!) que tinha o hábito de colocar na boca quatro cigarros acesos e dois nas narinas. Ele não gostava de ser chamado de “homem chama” e sim de Heleno de Freitas, pois dizem que ele (Heleno) se exibia fazendo isso no sanatório.
A cada dia que passa, um imóvel histórico é demolido. Barbacena cresce verticalmente com construções de prédios com inúmeros andares. A gente quer acreditar numa Barbacena receptiva, linda e atraente, mas depois de um final de mandatos do prefeito e vereadores, nos tornamos descrentes. Esperamos por tempos melhores. Até quando?