Entre bolos, sabores e lições

A crônica de Débora Ireno Dias

O ato de cozinhar aflorou em mim após o casamento, quando me vi dona daquele espaço onde, antes, eu só entrava para saborear as delícias feitas pela Mamãe. Casamento, refeições, tampas e panelas, cozinha própria, responsabilidade assumida. Cozinhar o próprio alimento é um desafio que enfrento há seis anos e posso dizer que tenho conquistado alguns elogios do Marido e Amigos. Já acumulo algumas histórias construídas entre doces e salgado, carnes e massas. Aprendi com Mamãe a oferecer algo feito pelas próprias mãos quando há reuniões em casa ou lanche partilhado, ocasiões para expressar um carinho através dos temperos.

Nisto de fazer algo para levar e oferecer a um grupo, recentemente fiz um bolo de chocolate para apresentar como “manifestação artística” no final de um curso de Mindfulness. (Um parênteses: sou ansiosa, viajo nos pensamentos, cobro-me por várias questões da vida que ainda não resolvi e estão sendo resolvidas na base da oração – terapia – meditação – auto-cuidado.) Escolhi levar o bolo porque, ao cozinhar, consigo trabalhar minha atenção plena, acalma a respiração e me faz feliz! Tudo a ver com o Mindfulness! Bolo assado e frio, hora de desenformar e por a cobertura. E estaria pronta minha manifestação artística!

Peguei a tábua onde o deixaria para servir.  Começaram as manobras de desenformar: passar faquinha nas laterais, virar a forma, dar tapinhas. Foi uma sucessão de tapinhas e viradas de forma. Nada do bolo se soltar! Parecia preso à forma igual a mim, diante de algumas situações da vida em que insisto em demonstrar falta de autoconfiança – baixa autoestima! De repente, um pedaço do bolo se desprendeu e ficou na tábua, o restante todo na forma! Um buraco negro! Primeira reação: acabou minha apresentação! Frustração, olhar cabisbaixo. Silêncio. Tempo para respirar e veio a segunda reação: improvisar! Peguei a massa solta, voltei para a forma, apertei, fiz uma boa cobertura de chocolate e olhei minha arte! Sim, arte! Tempos atrás, talvez eu tiraria tudo da forma, colocaria numa vasilha e deixaria na Mamãe. Mas vi que havia outra possibilidade: reformular meu plano, usar a criatividade, rir da situação e apresentar o bolo de chocolate mais incrível que eu já fiz.

Pode parecer boba esta história, mas para mim foi um grau de superação, um passo a mais na conquista da autoestima e no aprendizado de que não temos o controle de tudo, porém, podemos aprender a respirar e dar um tempo para o cérebro – e as emoções – se reorganizarem na busca de novas soluções. Não é sobre viver no improviso. É sobre conseguir se libertar das sensações de que tudo é controlável e de que não conseguimos tomar decisões acertadas.

Levei o bolo, apresentei-o com segurança (outra conquista) numa mesa arrumada, contei a história e todos se deliciaram – com o sabor e o papo bom após a aula.  Mais uma receita a ser arquivada no caderno da vida!

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