TJMG, STJ e os honorários advocatícios. Justiça mineira questiona tese vinculante

Quem já foi ou ainda é aluno meu sabe o quanto AMO ODIAR o Direito! 

Com o passar dos anos eis que surge um pingo de maturidade e enfim entendo que amo o Direito em sua teoria e simplesmente odeio sua equivocada aplicação, sobretudo na prática forense. E digo mais, boa parte de minha indignação vem da INSEGURANÇA JURÍDICA que vemos diariamente nos tribunais.

E que segurança jurídica posso esperar quando o Tribunal de Justiça de Minas Gerais “peita” entendimento finalmente exaurido pelo Superior Tribunal de Justiça e deixa de aplicar o CPC na fixação de honorários advocatícios sucumbenciais?

Para entender o recente ocorrido, permita uma breve contextualização:

Em março de 2022, o STJ finalizou importante controvérsia sobre aplicar ou não o Código de Processo Civil (CPC) na fixação de honorários advocatícios por equidade em causas quando o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório.

Em apertada votação (7×5) a maioria dos Ministros decidiram que não se aplica a fixação de honorários por apreciação equidade em causas de valor elevado. Assim, sobretudo quando a Fazenda Pública for a parte vencida, deve ser aplicado obrigatoriamente o Art. 85, §2º e 3º do CPC:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

(…)

  • 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I – o grau de zelo do profissional;

II – o lugar de prestação do serviço;

III – a natureza e a importância da causa;

IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

  • Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:

I – mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;

II – mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;

III – mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;

IV – mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;

V – mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos. 

Ainda não entendeu?

Bem, digamos assim, há uma preocupação em honorários sucumbenciais gigantescos em causas contra a Fazenda Pública, por exemplo, envolvendo Direito Ambiental, cujo valor da causa for milionário o que consequentemente (no caso da derrota do Estado) acarretaria sucumbência de milhares de reais em favor do advogado em detrimento ao erário e ao interesse público.

Não consigo pensar em hipótese melhor que o dano ambiental diante de ação ou omissão estatal. Quanto vale o meio ambiente? Qual valor da causa adequado nessa hipótese? E por fim, quanto vale o trabalho do advogado?

Não é o objetivo da Lei (CPC 2015) impedir que o advogado enriqueça com seu trabalho! A fixação de honorários advocatícios sucumbenciais em regra é (e continua sendo) devido em razão do valor econômico da causa. E de acordo com importante decisão do STJ (Processos: REsps 1.850.512, 1.877.883, 1.906.623 e 1.906.618) não se pode confundir causa inestimável com causa de valor elevado.

Em um sentido puro da palavra, inestimável é aquilo que não se pode estimar (nossa… parece definição superficial de dicionário…), ou seja, como diria antiga propaganda de cartão de crédito: é aquilo que de fato NÃO TEM PREÇO.

Diferente da condenação da Fazenda Pública em sucumbência de causa de valor elevado, porém perfeitamente estimado e adequado com seu valor patrimonial e econômico.

Evidente que a OAB sempre defendeu e festejou a decisão do STJ que adota o CPC como regra a ser obrigatoriamente respeitada (com perdão do pleonasmo). A Ordem dos Advogados do Brasil defendem com base no parágrafo 14 do mesmo Art. 85 do CPC que os honorários são verba alimentar devidas sucumbencialmente em favor do patrono da parte vencedora!

Ocorre que, poucos meses após o que deveria ser um marco a ser comemorado por advogados em todo Brasil, já foi questionado (e por quê não dizer descumprido?!) pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

E, em maio de 2022, a 20ª Câmara Cível do TJMG deu provimento parcial a um recurso para deixar de aplicar a regra fria e matemática do CPC reduzindo a condenação de honorários sucumbenciais de R$ 14.000,00 (quatorze mil reais) para R$ 2.000,00 (dois mil reais)!

O TJ mineiro assim simplesmente deixar de seguir o entendimento do STJ por entender que causa de valor elevado é semelhante a causa de valor inestimável e que assim os honorários sucumbenciais não devem ser aplicados por porcentagem sobre o valor da demanda, mas sim pelo esforço do advogado, dentre outros parâmetros previstos excepcionalmente pelo CPC.

A Desembargadora Lílian Maciel (relatora do Processo: 5005306-73.2017.8.13.0245) entende que a recente decisão do STJ não tem efeito vinculante pois se tratou de votação aperta (7×5, quase um empate para a magistrada mineira) e que para ter vinculação seria necessário ao menos 2/3 dos votos (confesso que desconheço essa regra legal após anos esperando o SUPERIOR Tribunal de Justiça finalizar recurso repetitivo sobre o tema.):

Afinal, se até no controle de constitucionalidade realizado pelo STF exige-se o quórum da maioria absoluta de seus membros, o mesmo deve ocorrer em nível dos tribunais superiores ante a importância dos precedentes de força vinculante. 

Se a Corte Especial do STJ – que foi quem julgou o tema relativo ao arbitramento dos honorários advocatícios por equidade -, é composta por quinze membros, o que seria louvável é que houvesse o quórum qualificado, isto é, de oito ministros favoráveis para fins de fixação dessa tese jurídica, com força vinculante. Essa seria uma posição mitigada em que não se conclui propriamente pela inconstitucionalidade do art. 927 do CPC, mas também não se autoriza que teses jurídicas tenham força vinculante sem uma aprovação robusta dos respectivos membros.

Considerando todo o exposto, no julgamento mencionado alhures, decidido por 07 votos a 05, pela impossibilidade de arbitramento de honorários por equidade quando o proveito econômico obtido pelo vencedor ou o valor da causa for muito alto, verifica-se que é o voto de apenas um ministro que definiu o placar, prevalecendo contra todos os demais votantes.

Portanto, tendo em conta tudo o que foi explanado, ao mencionado julgado do STJ não pode ser conferido efeito vinculante, pelo que esta Des.ª Relatora mantém seu entendimento pela fixação equitativa dos honorários sucumbenciais nos casos o arbitramento sobre o valor da causa não atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade ao labor desempenhado pelo advogado. 

Ah, detalhe importante: a causa apreciada pelo TJMG não era sobre dano ambiental (inestimável como explicado), mas sim de elevado valor por se tratar de revisão de juros bancários fixados de forma abusiva! 

E assim, a exceção se torna regra quando o juiz ou o desembargador julgar apropriado? Humildemente entendo que o TJMG acaba por rasgar a recente decisão do STJ que deveria ter finalizado enfim a controvérsia! Ou seja, é muita INSEGURANÇA JURÍDICA advogar no Brasil e fica o gosto amargo de aparentar que só os magistrados seriam merecedores de muitas cifras alimentares por seu relevante trabalho, mesmo não sendo hierarquicamente superiores a nenhum advogado, embora eu quisesse acreditar no rótulo de SUPERIOR do STJ.

NOTA DE REDAÇÃO: Cícero Mouteira é articulista, advogado, professor universitário e evidente defensor da recente decisão do STJ na fixação percentual dos honorários advocatícios sucumbenciais quando a causa tiver nítido e mensurável valor econômico ainda que elevado!

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