Os morcegos são vilões? Desmistificando os morcegos e entendendo aspectos biológicos e culturais

Por Vitória Oliveira, licenciada em Ciências Biológicas e membro do Centro de Estudos em Ecologia Urbana do IF Barbacena e Delton Mendes Francelino, coordenador do Centro de Estudos em Ecologia Urbana, do IF Barbacena.

Desde os primeiros Homo sapiens, o período da noite era um momento de muita vulnerabilidade. A sensação de insegurança ocasionada pela dificuldade de enxergar predadores e outros seres vivos resultou, ao longo do tempo, em processos culturais de mistificação de seres vivos de hábitos noturnos, como os morcegos, que são um dos grupos de animais que sempre motivou muita curiosidade e mistério, sobretudo por esse contexto, e também por características e comportamentos peculiares, como o hábito de dormir de cabeça para baixo, habitar cavernas, ter aversão à luz e por haver algumas espécies hematófagas (que se alimentam de sangue). Tudo isso resultou na construção de diversas lendas, associando-os a vampiros e até mesmo demônios (Andrade e Talamoni, 2015).

Apesar de todos os mitos, a imensa maioria das espécies de morcegos são inofensivas e constituem um grupo de seres vivos bastante interessante e diverso. Estão distribuídos em diversos continentes, com a maior diversidade de espécies em regiões neotropicais (Bordignon, 2006). Apresentam, portanto, grande variedade de fontes alimentares, podendo se alimentar de insetos, néctar, frutos e outros animais (Andrade e Talamoni, 2015). Por essa razão, esses animais não são vilões, e desempenham importante papel ecológico como polinizadores e no controle biológico de insetos, peixes e roedores, fundamental para manter o equilíbrio natural dos ecossistemas (Andrade e Talamoni, 2015). 

Por meio de processos evolutivos ainda não muito esclarecidos, os morcegos tiveram as mãos adaptadas ao voo e, apesar de serem constantemente comparados aos ratos, não há vínculos evolutivos entre os dois grupos. A adaptação que resultou nas asas dos morcegos é a razão pela qual o grupo se ganhou destaque na mídia, tendo sido associados à origem do vírus SARS-CoV-2, responsável pela pandemia de Covid-19. Isso porque pesquisas recentes evidenciaram que essa adaptação acabou por modificar também o sistema imunológico do grupo, quando comparado ao de outros mamíferos, tornando-os resistentes a patógenos e podendo ser verdadeiros reservatórios de virais.

Apoio divulgação científica: Samara Autopeças e Barbacena Online

Referências Bibliográficas: 

ANDRADE, T. Y. I.; TALAMONI, J. L. B. Morcegos, anjos ou demônios? Desmistificando os morcegos em uma trilha adaptativa.Rev. Simbio-Logias, V. 8, n. 11, Dez/2015. Disponível em: <https://www.ibb.unesp.br/Home/ensino/departamentos/educacao/revistasimbio-logias/morcegos_anjos_ou_demonios.pdf> Acesso em 29 de junho de 2020.

BORDIGNON, M. O. Diversidade de morcegos (Mammalia, Chiroptera) do Complexo Aporé-Sucuriú, Mato Grosso do Sul, Brasil. Rev. Bras. Zool., Curitiba, v. 23, n. 4, p. 10021009, dezembro de 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-81752006000400004&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 29 de junho de 2020.https://doi.org/10.1590/S0101-81752006000400004 .

MORATELLI, R.; CRUZ-NETO, A. P.; FILARDY, A. Os morcegos e os vírus mortais.UNIVESP, Universidade Estadual de São Paulo, 06 de abril de 2020. Disponível em: <https://www2.unesp.br/portal#!/noticia/35662/os-morcegos-e-os-virus-mortais/> Acesso em: 29 de junho de 2020.

REIS, N. R.; PERACCHI, A. L.; PEDRO, W. A.; LIMA, I. P. Morcegos do Brasil.Londrina, 253p, 2007.