O som romântico dos pernilongos

Por Francisco Santana

Um pernilongo incomoda muita gente/dois pernilongos incomodam, incomodam muito mais!
Três pernilongos incomodam muita gente/
quatro pernilongos incomodam, incomodam, incomodam, incomodam muito mais!

 

ZZZzzzzzzzZZZZzzzzz essa é a característica do zumbido infernal dos pernilongos.  É uma melodia ensurdecedora, irritante, que me deixa louco e tira o meu sono. “O zumbido é resultado da alta frequência do batimento das asas dos mosquitos, que, dependendo da espécie, pode chegar a mil movimentos por segundo. É como se cada inseto fosse um microventilador”, diz o entomologista (estudioso dos insetos) Delsio Natal, da Universidade de São Paulo (USP). 

 

E a picada deles? É outro martírio. No local fica um caroço e uma coceira interminável e dolorida. E a gente começa a autoflagelação. Lá vem ele: ZZZzzz é tapa no pé, ZZZzzz é tapa no braço, ZZZzzz é tapa no rosto e ZZZZZzzzzz é tapa na orelha, ZZZZZZZZ é tapa no pé do ouvido. Esse é o pior de todos. Você se levanta da cama, acende a luz, pega o que tiver pela frente e vai à caça deles. Mata um, dois, três, quatro e até cinco, para ira da esposa que reclama das manchas de sangue nas paredes. Depois dessa matança você sorri e volta para a cama pensando que exterminou todos. Ledo engano, o ZZZZzzzz volta a reinar no seu quarto. Eu tive um professor de Yoga que considerava esse zumbido um canto romântico que o fazia meditar. Gosto não se discute.    

 

Para o biólogo e professor da PUC Minas, Henrique Paprocki, “eles nos picam somente porque precisam do nosso sangue para se reproduzirem, e que para todo recurso existente na natureza, existe algo ou alguém que vai consumi-lo. Assim é com a água, com os alimentos que ingerimos e até com o lixo, que é consumido por outros animais, como ratos e baratas. No caso dos pernilongos, nosso sangue é o recurso natural e eles são os “consumidores”, e eles também servem de comida para outros animais, como aranhas e lagartixas. Somente as fêmeas do pernilongo picam. Elas são atraídas por odores emitidos pela nossa pele. A coceira que surge após a picada se deve a proteínas existentes na saliva do inseto que, em contato com o nosso corpo, causam alergia. Apesar de todo o incômodo causado pelos pernilongos, eles têm uma vida bem curta: 30 a 90 dias, em média.”

Na semana passada, com aquela mudança climática em Barbacena, passei pelo mesmo processo de sofrimento. Depois da longa batalha campal, fui dormir às 23h, ou melhor, tentar dormir. De repente, meu quarto foi invadido por um som que parecia um concerto das bandas: Queen, AC/DC, Metallica, Nirvana, Kiss, Deep Purple, Led Zeppelin, Rush, Yes, Pink Floyd, The Who, U2, Iron Maiden e Van Halen.  Abri os olhos e percebi que meu corpo estava sendo transportado. Saí do quarto, passei pelo corredor, cheguei à sala e foi aí que percebi milhares de pernilongos carregando o meu pesado corpo. Gritei clamando por socorro e disse a eles: “Por favor, me coloquem no chão!” Eles fazem muitos estragos, mas são obedientes e me jogaram no chão. A dor da queda me fez acordar. Foi então que percebi que eu continuava no meu quarto, na minha cama, porém, todo molhado literalmente e muito feliz por saber que ainda estava vivo e que passara por um pesadelo.   

Eu não quero saber se quem pica a pele da gente é a pernilonga, se ela quer o nosso sangue apenas para se reproduzir, se sua vida útil (inútil) oscila entre 30 a 90 dias, que seu zumbido pode ser romântico para muitos, eu só quero esse inseto bem longe de mim, de preferência nos quinto dos infernos ou na casa do leitor dessa crônica para corroborar com o que relatei. 

(Fonte: Afinal, para que servem os pernilongos? Revista Encontro Atualidades).