Meu Deus, não sei rezar! Perdoe-me, por favor…

Por Francisco Santana

– Chico, está passando da hora de você conhecer Jesus!

– Mãe, eu já conheço o Sr. Jesus. Ele é pai do meu amigo Marquinhos e ainda hoje eu o vi no bar do Malvar.

– Chico, eu não estou falando do Sr. Jesus, pai do Marquinhos, estou falando do Jesus Cristo.

– Tudo bem, mãe, já que a senhora quer que eu o conheça, é só convidá-lo para vir em nossa casa que passarei a conhecê-lo.

– Chico, não deboche de mim, estou falando do Jesus Cristo, Filho de Deus, homem misericordioso e autor da frase: Amai-vos uns aos outros como eu vos amei“. Ela representa o mais puro amor.  Entendeu agora? 

– Mãe, esse Jesus Cristo que a senhora mencionou eu já o conheço e ele mora dentro do meu coração. 

– Chico, Ele só vai estar no seu coração para lhe servir de exemplo, lhe mostrar o caminho da justiça e da bondade utilizando-se da superação, determinação, fé e coragem, depois que você receber a hóstia sagrada. Para isso, você terá que se preparar espiritualmente fazendo a Primeira Comunhão. Amanhã você vai à tarde à Igreja de São José, procurar a catequista Dona Elza e fazer a sua inscrição. Ontem conversei com várias vizinhas e elas me disseram que seus filhos estão matriculados para esse importante Ato Religioso. 

 

Fiz o que a minha mãe determinou. As instruções seriam ministradas aos sábados à tarde e com a proximidade da Primeira Comunhão e com o aprendizado do grupo, poderíamos ter duas aulas por semana. No primeiro dia, percebi que eu estava entre conhecidos e até amigos. O grupo era formado de 10 jovens entre meninos e meninas. Nós tínhamos quatro catequistas: Elza, Selene, Maria de Lourdes e Leonor. O primeiro ensinamento delas, após as apresentações foi conceituar a expressão Primeira Comunhão: “É o ato religioso da Igreja Católica no qual é celebrada a primeira vez que a criança cristã irá receber o Corpo e o Sangue de Cristo (sob a forma de pão e vinho). Trata-se de um dos Sacramentos da Igreja. A hóstia é representada neste rito religioso como o pão. Mas uma curiosidade que poucos sabem é que esta é feita a partir de um pão sem fermento, produzido com água e farinha de trigo, sem a adição de fermento ou sal. A produção da hóstia, que será consagrada pelo sacerdote, ainda é feita de forma artesanal em algumas localidades”.

 

Em seguida, muitas instruções nos foram passadas além de orações e cantos. Percebi que os colegas sabiam tudo de cor e salteado. Eu me considerava o pior aluno do grupo. Decorar nunca foi o meu forte, sempre preferi ouvir, entender, interpretar e dizer. Lá não tinha lugar para isso. Era assim: decora ou decora. Meus amiguinhos disseram que em suas casas os pais e irmãos lhes ensinavam a orar, cantar e alguns disseram que durante a noite, os pais liam histórias bíblicas para eles. Contei isso para minhas irmãs e elas passaram a me ensinar. Essa ajuda foi valiosa para meu aprendizado, embora, reconhecendo algumas limitações tais como timidez, dificuldade de decorar e ansiedade. 

 

Uma guerra psicológica apareceu repentinamente. Fomos informados que o pároco da Igreja, Padre Hilário da Mota Barros, ficou de nos visitar para trolhar sobre os ensinamentos. Isso exposto exigia de nós, mais estudos e concentração. Sua arguição poderia ser de forma individualizada ou dirigindo perguntas para o grupo. Nós íamos às aulas preocupados com essa visita surpresa. Esse padre tinha a fama de mal humorado. Que Deus nos ajude. 

 

Um questionário nos foi passado para uma sabatina na próxima aula. Tivemos uma semana de muitos estudos. Quando já tínhamos nos esquecido da visita do Padre Hilário, eis que ele aparece distribuindo simpatia, generosidade, solícito, sorridente, passando a mão em nossas cabeças e perguntando o nome de cada um. Ao dizer o meu, Francisco de Santana, ele disse ser um nome bonito e santificado. Falou sobre São Francisco de Assis que era o protetor dos animais e me perguntou se eu gostava de animais. A minha resposta gerou muitos risos: “Gosto muito de animais, eles em suas jaulas fechadas e eu na minha casa fechada”. Falou sobre a Santa Ana, mãe de Maria, e avó de Jesus Cristo. Passamos com ele momentos de muita descontração. O seu conceito de mal humorado se mudou por inteiro. As catequistas fizeram perguntas, que foram respondidas pelo grupo e depois cantamos. Eu fiz mímica.

 

Ele nos informou que já estávamos preparados para deixar Jesus Cristo entrar em nosso interior. Vibramos por dentro. O ato da confissão fora marcado para o próximo sábado. Chegou o dia. Como rimos fazendo piadas para esconder o nervosismo. Carlos Gomes, meu amigo disse que a minha confissão iria demorar horas porque sou um pecador contumaz. Rebati dizendo que ela não passaria de dois minutos, pois, eu só tinha um pecado a confessar e que ele englobaria todos os demais. A turma queria saber que é pecado era esse. “Pecados não são para serem propagados”, disse eu. Como ninguém queria ser o primeiro, lá fui eu. Todos ficaram boquiabertos, entre a minha confissão e penitência não demorou mais que dois minutos. 

 

No domingo receberíamos o corpo de Cristo. Lá estávamos na missa das 10h para a Comunhão. Eu trajava calça azul marinho com suspensórios, camisa social branca, uma gravata com um laço, sapato preto de verniz, meias brancas, uma vela amarela com um adesivo de um santo nas mãos postas em oração. Foi um ritual emocionante ver os fieis cantando, nos saudando e meus familiares me prestigiando. Todos se diziam sentir mais leves pelo dever cumprido. Tudo terminou com um lauto lanche a nós servido. O nosso grupo, sempre coeso e amigo se despediu com lágrimas e se dispersou. Cerimônia marcante.

 

Amigo leitor, no questionário a nós distribuído para sermos sabatinados na próxima aula constava do seguinte: Teríamos que fazer o sinal da cruz, orar o Pai Nosso, Ave Maria, Glória ao Pai, Salve Rainha, Creio, Oremos, Saudação à Nossa Senhora, decorar os Mandamentos da Lei de Deus, Mandamentos da Igreja, Sacramentos da Igreja, Ato de Constrição, Mistérios Principais da Fé, Mandamentos da Caridade, Dons do Espírito Santo, Virtudes Cardeais, os Sete Pecados Capitais e mais os cantos. Você ainda se lembra das respostas? Seja sincero! 

 

Mãezinha do céu, eu não sei rezar/Eu só sei dizer: Eu quero te amar/ azul é seu manto/ branco é seu véu/Mãezinha, eu quero te ver lá no céu/ Mãezinha, eu quero te ver lá no céu.